VÍDEO: Fantástico desvenda como funcionava o esquema de corrupção no futebol da Paraíba; Atlético de Cajazeiras, Sousa e Nacional de Patos são citados na matéria
A reportagem teve acesso aos documentos e às escutas telefônicas. Foram mais de 100 mil conversas de 115 telefones monitorados pela Polícia Civil e pelo Ministério Público da Paraíba.
De um lado, dirigentes; do outro, justamente aquele que deveria primar pela imparcialidade: o árbitro de futebol. A reportagem deste domingo do Fantástico mostrou como funciona o esquema de corrupção e manipulação de resultados no futebol paraibano.
A reportagem teve acesso aos documentos e às escutas telefônicas. Foram mais de 100 mil conversas de 115 telefones monitorados pela Polícia Civil e pelo Ministério Público da Paraíba. A reportagem apresenta alguns jogos onde houve uma forte interferência nos bastidores. De acordo com as investigações, o Botafogo-PB foi o maior beneficiado – ou, pelo menos, aquele que mais agiu para tirar proveito.
Num dos trechos gravados pela Polícia, aparece uma conversa suspeita entre o vice-presidente de futebol do Botafogo-PB, Breno Morais, e o então presidente da Comissão de Arbitragem da FPF, José Renato Soares – que acabaria afastado do cargo no dia 20 de abril.
– Eu quero um cara (árbitro) domingo. É o seguinte: se o jogo estiver apertado, ele dá um jeito de criar oportunidade, né? Uma bola que o cara raspou a perna no meu jogador dentro da área, é pênalti. É isso que precisa. Mas para fazer só o que o time faz e depois buscar o dinheiro não dá, né, filho? – cobrou Breno.
Esse dinheiro, de acordo com os árbitros que colaboraram com as investigações, era propina. De acordo com o depoimento de um deles, jogo pequeno chegava a R$ 15 mil. Semifinal ou final poderia ir até R$ 50 mil.
Para o delegado Marcos Paulo Vilela, as escutas e os documentos apreendidos na operação desencadeada no dia 9 de abril já são suficientes para comprovar a corrupção no futebol paraibano.
Botafogo-PB seria o maior favorecido
Treze x Botafogo-PB, 18 de fevereiro. O clássico em Campina Grande era muito importante para o Belo. Embolado na classificação do Grupo A, o time corria o risco de sair da zona de classificação se perdesse. Por isso, de acordo com a Polícia Civil, agiu nos bastidores para garantir o resultado. Mesmo com a vitória, o vice-presidente do futebol botafoguense, Breno Morais, não se mostrou satisfeito e cobrou satisfação do assistente Tarcísio José, mais conhecido como Galeguinho, e que também estaria no esquema.
O lance em discussão é o primeiro gol do Treze, quando o Botafogo-PB vencia por apenas 1 a 0. Diego Neves marcou, mas a bola não chegou a torcar as redes. O lance foi rápido e suscitou dúvidas entre os torcedores se a bola realmente tinha entrado. Na gravação, Tarcísio José explica por que confirmou o gol.
– Mas eu tinha que dar o gol. Porque a bola entrou. Um negócio que a televisão mostrou – justificou o assistente, lembrando que a partida tinha transmissão para todo o Brasil.
Do outro lado, Breno retruca:
– Tem esse negócio de televisão não…
Dirigente escala assistente para jogo
Na maior parte das escutas, Breno Morais aparece tratando com o próprio José Renato Soares, o ex-presidente da Comissão de Arbitragem. Mas ele tinha liberdade de conversar diretamente com os árbitros e assistentes.
Numa outra ligação monitorada com Tarcísio José, logo após o jogo contra o Treze, o dirigente do Botafogo-PB fala abertamente sobre a escala da partida entre Nacional de Patos e CSP, que interessava diretamente ao Belo. O diálogo é o seguinte:
Breno: Eu posso botar você em Patos?
Tarcísio José: Bote aí…
Breno: Você vai ajudar? O Nacional não pode ganhar!
De acordo com as investigações, o Botafogo-PB conseguiu emplacar árbitro e assistente do jogo em Patos. O Nacional perdeu por 2 a 0 e teve até um gol anulado em lance polêmico. O resultado acabou sendo determinante para o Botafogo-PB terminar em segundo lugar na tabela e o time sertanejo teve que disputar o Torneio da Morte, lutando contra o rebaixamento.
Procurado pela reportagem, o assistente Tarcísio José garantiu que nunca recebeu propina de nenhum dirigente.
Sorteio da arbitragem era fraudado
Mas, como os dirigentes conseguiam escalar os árbitros, se existia um sorteio? Para a polícia, era tudo uma encenação.
– A investigação comprova que esse sorteio muitas vezes foi fraudado – revela o delegado Lucas Sá.
Para o procurador-geral de Justiça da Paraíba, Francisco Seráphico, os crimes estão claros.
O esquema, ainda de acordo com as investigações, funcionava há pelo menos três anos. Mas nem sempre dava certo, como aconteceu na partida entre Atlético de Cajazeiras e Sousa, também no dia 18 de fevereiro. Novamente era o Botafogo-PB o interessado no resultado, dessa vez, na vitória do time da casa – pelo mesmo motivo, uma vez que o Sousa também brigava com Nacional e Botafogo-PB pela classificação.
Breno fala pelo telefone com José Renato Soares:
– Quem tem que ganhar é o Atlético. Aqui tem uma premiação de tanto para você. É assim que tem que fazer – disse Breno, supostamente orientando o então presidente da Comissão de Arbitragem no que teria que dizer para o juiz do jogo.
O dirigente do Botafogo segue o diálogo:
– O cara vai apitar o jogo para fazer o time da casa ganhar. Quer mais moleza do que isso?
Só que o Sousa venceu. E, ironicamente, com um gol nos acréscimos. Em nova conversa gravada com Breno Morais, o então presidente da Comissão de Arbitragem tentou se explicar e criticou a conduta do árbitro Antonio Umbelino, que “permitiu” o gol no final do jogo.
– Quarenta e cinco e o cabra dá cinco minutos? E o cara faz um gol com 49… É complicado – disse José Renato Soares.
Breno concorda e ainda ironiza:
– É falta de cuidado. Falta de gostar de receber alguma coisa, né?
José Renato emenda:
– Não tem zelo pelo negócio.
Breno Morais ficou em silêncio no depoimento
A reportagem do Fantástico procurou Breno Morais, mas ele não atendeu os recados deixados em seu telefone e nem retornou as ligações. Em seu depoimento à Polícia, o dirigente preferiu o silêncio.
– Prefiro exercer o meu direito de ficar em silêncio.
Em nota, o Botafogo-PB disse que “preza pela ética e que ninguém pode ser condenado antes do fim de um processo”.
Jogadores não tinham conhecimento do esquema
São 85 pessoas investigadas pela polícia e pelo Ministério Público. Dirigentes, ex-dirigentes e árbitros. Mas, até aqui, nada indica que os jogadores tinham conhecimento de todo esse esquema. Um dos delegados à frente do caso, Lucas Sá confirma isso.
– Até agora nenhum jogador demonstrou ter o conhecimento dessa manipulação de resultados ou que possa também ter atuado no sentido de favorecer ou mudar a sua postura em campo.
Fraude constatada em prova para a CBF
As investigações da polícia mostram que o esquema não se limitava apenas a manipulação de resultados no Campeonato Paraibano. Chegou até a CBF e colocou em xeque a prova para árbitros. Foi isso que ficou claro em outro telefonema monitorado, dessa vez entre José Renato Soares e o árbitro Renan Roberto de Souza.
José Renato estaria de posse da prova da CBF e liga para Renan, para que ele responda às questões. Eis o diálogo
José Renato: Corre para cá. Deu certo.
Renan: Deu?
José Renato: Corre para cá para a gente responder e já fazer o gabarito.
Em seguida, José Renato Soares liga para um diretor da FPF com as respostas em mão:
– Vá memorizando: B-A-C-C-A, B-A-C-C-A, B-A-C-C-A, com dois cês; AACD, AACA…
Em depoimento à Polícia, José Renato Soares negou qualquer tipo de vazamento de informação sobre a prova. A reportagem também foi até a casa do ex-presidente da Comissão de Arbitragem, mas ele não respondeu às chamadas.
O juiz Renan Roberto diz desconhecer a gravação.
A CBF, por sua vez, suspendeu todos os árbitros da Paraíba . Disse ainda que a prova e o gabarito foram enviados um dia antes para o instrutor que aplicou o teste e que apoia a investigação no futebol paraibano.
Fonte: GE - https://globoesporte.globo.com/pb/futebol/noticia/fantastico-desvenda-como-funcionava-o-esquema-de-corrupcao-no-futebol-da-pb.ghtml
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