Sem abandonar filosofia, Ajax se reinventa para ameaçar reinado de Cristiano Ronaldo na Europa
Equilíbrio entre produção de futuros craques e reforços fundamentais recoloca gigante holandês na rota dos maiores do continente. Time supera média de três gols por jogo na temporada
Se você já passou dos 20 e poucos anos muito provavelmente se lembra do glorioso Ajax dos anos 90, de finais seguidas da Liga dos Campeões – um título sobre o Milan e um vice para a Juventus, adversária desta quarta-feira pelas quartas de final, às 16h (de Brasília), em Amsterdã. O GloboEsporte.com transmite em Tempo Real.
Bem, mas se você é mais novo ou simplesmente não está com a memória em dia para o futebol, recomendo correr atrás. Lá jogavam Van der Sar, Danny Blind, os irmãos Frank e Ronald De Boer, Davids, Overmars, Rijkaard, Seedorf, Litmanen, Kanu e Kluivert. Juntos.
Aquele foi o último grande ato do gigante holandês na Europa. Logo depois veio a Lei Bosman, que permitiu aos jogadores atuarem em outros países da União Europeia praticamente sem restrições. O Campeonato Holandês aos poucos deixou de ser atrativo num primeiro nível para se tornar um celeiro de futuros destaques pelo continente. Os clubes, logicamente, acompanharam esta decadência.
Desde 2002/03 o Ajax não chegava tão longe numa Champions. Está a cinco jogos do título, mas vem de uma caminhada que começou em julho, 10 dias depois da final da Copa do Mundo, na segunda fase preliminar. Passou por Sturm Graz, Standard Liège e Dínamo de Kiev até alcançar os grupos. Depois deixou AEK e Benfica para trás, arrancou dois empates com o Bayern e, por fim, eliminou o atual tricampeão Real Madrid. Agora desafia o reinado de Cristiano Ronaldo em seu novo clube.
Pode vir a ser uma temporada de exceção, até porque o Ajax é feito para se reinventar. Suas estrelas não saem mais do clube no auge técnico e físico, mas permanece importantíssimo revelá-las de acordo com o que o clube enxerga o futebol.
– Como nossos jogadores passaram a ir embora antes, deveríamos nos assegurar que se formassem antes para poder integrar o time principal. Não podemos esperar que cumpram 24 anos para que estejam prontos para competir duas vezes por semana com intensidade física e mental. Esse processo levou muito tempo. Mas conservamos a filosofia e mentalidade do clube. Gostamos de um estilo, você pode vincular facilmente o Ajax ao Barcelona, com a diferença de que para nós é mais fácil dar oportunidades aos jovens – disse Edwin van der Sar, lendário goleiro e diretor-executivo do Ajax, em entrevista ao “El País”.
Investimos € 26 milhões no nosso centro de treinamento porque nosso objetivo não é esperar que os jogadores completem 22 anos para estarem aptos, e sim que subam para o profissional com 16 ou 17
– Num mundo ideal eles ficariam até os 26 anos e os venderíamos pelo maior valor possível. No mundo real que vivemos desde a Lei Bosman, é muito difícil segurar o talento. Não é casual que a última dinastia do Ajax tenha sido nos anos 90, quando somente permitiam três estrangeiros por clube. Agora não podemos competir com as cinco maiores ligas da Europa, com seus direitos de TV e salários. Aqui um jogador ganha cinco ou seis vezes menos. Para nós a ambição é desenvolver e educar jogadores de primeiro nível mundial. E, naturalmente, os jogadores querem jogar com os melhores. Isso pesa até mais do que o salário – completou.
Isto nos leva a Frenkie de Jong. O volante de 21 anos é um jogadoraço – e por isso o Barcelona resolveu pagar € 75 milhões para contratá-lo na próxima janela. Foi a maior venda do clube, que repassará 10% ao Willem II por um acordo feito em 2015, quando o buscou ainda para a base pelo valor simbólico de € 1.
O próximo da lista deve ser Matthijs de Ligt, zagueiro de 19 anos observado por Barça e Juventus. Ele, Van de Beek, Mazraoui (hoje suspenso) e Schöne não custaram nada aos cofres do clube e se misturam com reforços fundamentais que ajudaram a recolocar o Ajax na rota dos maiores do continente.
Ainda assim, competir no exterior é uma missão para lá de ingrata. O Ajax não figura entre os 30 maiores faturamentos da Europa desde 2014 (foi 29º) e gastou € 400 milhões a menos do que a Juventus para formar o seu elenco, por exemplo. Dos 32 participantes da Champions, tem apenas o 16º maior valor de mercado, segundo o site especializado “Transfermarkt”.
Van der Sar e o diretor de futebol Marc Overmars (lembrou dele no início do texto?) não trabalham com margem de erro. O Ajax não conquista um título sequer desde a Eredivisie 2013/14 e por isso foi ao mercado com maior agressividade nos últimos anos, procurando nomes um pouco mais experientes para mesclarem com quem vinha da base – os três atacantes estão entre os seis mais caros da história do clube. Tadic tem 30 anos, Blind, 29, Tagliafico, 26.
As vendas também permitiram investir. Além de De Jong, o Ajax ganhou mais de € 115 milhões em menos de três anos com Davinson Sánchez (Tottenham), Klaassen (Everton), Milik (Napoli) e Justin Kluivert (Roma).
Se aumentar o corte poderíamos considerar outros nomes como Suárez, Sneijder, Eriksen, Ibrahimovic, Vertonghen… Trata-se de um clube que preserva a sua classe. O Ajax me faz lembrar do 4-3-3, da excelência técnica, dos meio-campistas completos, de Cruyff. Possui uma identidade inconfundível, errando ou acertando no meio deste processo.
– O Ajax é um símbolo de um estilo de futebol. Uma escola. Passam os anos e a ideia de jogo não muda. Talvez hoje não haja mais jogadores com tanta qualidade, mas o estilo não se negocia – afirmou o lateral-esquerdo Nicolás Tagliafico, também ao “El País”.
Veja os meninos de 10 anos que você não vai acreditar como jogam: controlam a bola bem orientados, se equilibram para dar um passe, fazem tabelas. Eu com essa idade na Argentina corria atrás da bola. Esses garotos jogam em equipe
– O Ajax me abriu a cabeça. Não importa o resultado, não importa contra quem nem onde, aqui é jogar e jogar. A última opção é dar um chutão para o atacante, olham torto para você. Aqui eu aprendo o tempo todo que é preciso dar valor à bola – encerrou.
Este Ajax a trata com carinho. No fim de semana, tornou-se o primeiro time desde 1987/88 a marcar 100 gols no Holandês antes da 30ª rodada. A média de toda a temporada é de 3,04 gols por jogo, superior até ao Manchester City de Pep Guardiola (2,77).
E a Juventus sabe bem que uma filosofia é meio caminho andado.
Fonte: Globo Esporte - https://globoesporte.globo.com/futebol/futebol-internacional/liga-dos-campeoes/noticia/sem-abandonar-filosofia-ajax-se-reinventa-para-ameacar-reinado-de-cristiano-ronaldo-na-europa.ghtml
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